História e Epistemologia da Física - A Perspectiva de Gerald Holton (2)



Plano X-Y

Conceito de força
Lei da gravitação universal



Dimensão fenoménica X: Observação de aspectos qualitativos
Medições
Deflexão dos corpos sólidos

Experiência de Cavendish




Dimensão heurístico-analítica Y : Cálculo de vectores- Lei do paralelogramo







1.3. Limitações do modelo bidimensional


Omite ou chega mesmo a negar a existência de outros mecanismos activos que impregnam o quotidiano dos investigadores científicos e é estéril no domínio da história da ciência. Se a ciência fosse bidimensional, o trabalho dos cientistas num dado domínio poderia, vir a ser dirigido segundo um protótipo rígido e uniformemente aceite(...) porque motivos muitos cientistas, particularmente na fase emergente de uma pesquisa, estão dispostos a aderir firmemente, correndo inclusivamente grandes riscos, ao que pode ser considerado uma suspensão da dúvida quanto à possibilidade de infirmação? Porque continuam sem ter provas empíricas a seu favor ou até perante provas desfavoráveis? (G. HOLTON,1998,176-177)

1.4. Cada cientista tem os seus pressupostos fundamentais, os quais não são directamente deriváveis da observação nem do raciocínio analítico- estes pressupostos ou temas revelam-se na motivação do seu trabalho concreto- e tem concomitantemente o seu mapa, de noções condutoras fundamentais que podem, considerar-se separadas, como a estrutura de bandas dos cromossomas do núcleo de uma célula. As opções, as escolhas efectuadas por um cientista entre os diversos pressupostos possíveis, quando operadas conscientemente são juízos.(...) As preferências temáticas de um cientista podem favorecer um ou outro de dois ou três temas antitéticos, que remontam , por vezes a especulações muito antigas(...) escolhas entre complexidade e simplicidade, reducionismo e holismo, descontinuidade e contínuo, níveis hierárquicos e unidade, evolução/degradação e estado estacionário modelos mecanicistas/materialistas/matemáticos, causalidade/probabilismo, análise/síntese, etc. (...) A análise temática, portanto, é, em primeiro lugar, a identificação do mapa específico dos vários temas que, como impressões digitais, caracterizam um cientista individual, ou parte de uma comunidade científica, em dada época. ( G. Holton, 1998, 182-183)

1.5.1. Exemplos de análise temática:

Conceito de força e o princípio de potência. Platão, Aristóteles, Newton, Mayer, Helmholtz.
As leis de conservação da física, por exemplo a lei de conservação do momentum, formulada, de forma frutuosa, pela primeira vez por Descartes. O tema da conservação permaneceu como um guia ao longo da história da física, mesmo quando a linguagem mudou.

1.5.2. Fontes dos temas:

A ocorrência de temas não é exclusiva apenas da ciência nos últimos séculos. Pelo contrário, observamos a componente temática desde os primórdios, nas origens das ideias cosmogónicas fundadas na Teogonia de Hesíodo e no Genesis.
Na verdade, é visível a persistência das grandes questões e a obstinação de certos padrões pré- seleccionados, para definir e solucionar problemas nas especulações cosmológicas (os milésios, por exemplo).
Agora o aspecto mais significativo é que quando passamos estas concepções do plano animístico para o nível físico, a fórmula da cosmogonia ocorre repetidamente ponto por ponto, nos nossos dias, nos campos evolucionistas da moderna cosmologia. A recente teoria acerca do modo como o mundo começou propõe uma progressão do universo de uma mistura de radiação e de neutrões no tempo t=0; através dos subsequentes estados de diferenciação pela expansão e deterioração-decomposição do neutrão, e finalmente a construção a partir dos elementos mais pesados através do processo de fusão termonuclear, preparando o terreno para a formação das moléculas. E até a oposição à cosmologia evolucionária , designada da tradição de Parménides, tem o seu equivalente actualmente na teoria cosmológica do estado-estacionário.
Assim sendo, as questões- respeitantes à possibilidade da matéria-prima, da evolução, da estrutura, dos infinitos temporal e espacial- persistem bem como a as escolhas entre respostas alternativas para o problema. Estas continuidades temáticas aludem à dimensão obversa do papel iconoclasta da ciência; a ciência tem temáticas gerais de criação e temáticas funcionais. James C. Maxwell expressou-o lindamente um século atrás a propósito da mecânica molecular:
A mente do homem sente-se espanta-se a si própria com muitas e complexas questões. O espaço é infinito, e em que sentido? O mundo material é infinito em extensão, e todos os lugares da sua extensão estarão igualmente cheios de matéria? Os átomos existem, ou a matéria é infinitamente divisível?
A discussão de questões deste tipo foram debatidas desde que o homem começou a raciocinar, e para cada um de nós logo que obtemos o uso das nossas faculdades, as mesmas velhas questões surgem frescas como sempre. Elas formam uma parte essencial da ciência do século XIX da nossa era, assim como do século XV e antes dele.
Podemos acrescentar as questões temáticas que não obtiveran solução e foram postas à margem. O atomismo do século XIX triunfou sobre os vórtices de éter de Kelvin- mas apareceram entáo as teorias de campo que trabalham, novamente, com as partículas da matéria enquanto singularidades, agora num século XX- tipo continuum. A versão moderna da teoria cosmológica baseada no tema do ciclo de vida( Começo, Evolução e Fim) parece triunfar no terreno experimental sobre a teoria rival baseada no esquema da Existência contínua, e atirá-la pela janela- mas podemos estar certos de que este tema voltará a entrar pela porta das traseiras. Contrariamente para as teorias que, se baseiam no plano contingente x-y, a temática não é provada ou desaprovada; ela nasce e cai e nasce de novo, consoante as correntes contemporâneas da utilidade ou moda intelectual. E, ocasionalmente um grande tema desaparece ou um novo tema desenvolve-se e luta por se estabelecer, pelo menos durante algum tempo.
A temática actualmente usada na ciência é sobretudo implícita, mas não deixa de ser menos importante. Para entender plenamente o papel da hipótese ou da lei no desenvolvimento da ciência, precisamos de a ver também como uma exemplificação de motivos persistentes, por exemplo, o tema da constância ou da conservação; da quantificação; do discreto atómico; ou da inerência do comportamento probabilístico; ou- para retomar o exemplo de Newton- da interpenetração dos mundos da teologia e da física.Na verdade, neste sentido, podemos estabelecer uma diferenciação útil entre o Newton público, experimentalista e matemático, situado no plano x-y; e o Newton secreto e filósofo natural, abrangido pelo espaço proposicional x-y-z.
Einstein, Bohr, Pauli, Born, Schrodinger e Heisenberg, foram cientistas que vivenciaram conscientemente a correlacção x-y-z, todavia a maioria dos cientistas, projecta progressivamente o seu discurso do espaço x-y-z para o plano x-y.

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