MiOpia
MiOpia
Tiro os óculos e as cores transbordam das formas,
As luzes tornam-se girândolas.
Volto a colocar os óculos sobre o nariz.
As cores são enquadradas pelas formas, aprisionadas.
Notas dispersas sobre Dorian Gray de Óscar Wilde
Há algum tempo atrás pensei que Dorian Gray representava a antítese de Narciso, porque embora em ambos se opere um processo de auto-conhecimento, ao contrário de Dorian Narciso renasceria na flor…Hoje já não sei
“Só os sentidos podem curar a alma, assim como só a alma pode curar os sentidos.” Óscar Wilde, Dorian Gray, (Lisboa, Portugália, s/d), p. 42
Dorian Gray ao encontrar o seu duplo no quadro, a imagem que se anima perante aquele mesmo que a vê, inicia uma experiência que lhe será fatal, culminando na destruição ou melhor dizendo na tentativa de destruição do quadro — momento da junção de Dorian e do duplo. Pp.369-370.
“A insinceridade é assim uma coisa tão terrível? Penso que não. É simplesmente um método pelo qual nós podemos multiplicar as nossas personalidades.
Era essa de certo modo a opinião de Dorian Gray. Admirava-se da superficialidade da psicologia daqueles que concebem o Eu no homem como uma coisa simples, permanente, duma só essência, e em que se pode confiar. Para ele, pelo contrário, o homem era um ser com miríades de vidas e miríades de sensações, uma criatura complexamente multiforme, que trazia dentro de si estranhos legados de pensamento e paixão, cuja própria carne estava infeccionada das monstruosas doenças dos mortos.”op.cit. pp.239-240.
O terror desencadeado pelo conhecimento de si alia-se por vezes a uma intensa fascinação. Dorian Gray após ter experimentado horror perante a modificação inicial operada no quadro (pp.155-159) — horror que nunca deixará de sentir, embora só por vezes tal sentimento aflore (pp.203 -207) — experimenta, depois, um estranho prazer na contemplação das mutações do seu retrato espiritual, (p.256) este comprazimento, também nunca o abandonará: “Haveria, assim, um autêntico prazer em espiar a modificação operada nas suas feições. Poderia seguir o seu pensamento até aos seus mais recônditos refolhos. Este retrato seria para ele o mais mágico dos espelhos. Assim como lhe revelaria o aspecto exterior do seu corpo assim lhe revelaria a intimidade da sua alma.”(p.182)
O romantismo alemão atribuiu ao duplo uma ressonância trágica e fatal, o duplo pode ser uma entidade complementar, mas na maior parte das vezes ele incita ao combate. Encontrar o duplo é nas tradições antigas um acontecimento nefasto, por vezes, mesmo, um sinal de morte. Ver Jean Chevalier; Alain Gheerbrant, Dictionnaire des Symboles, (Paris, Robert Laffont, 1982), pp.364-365.
Tiro os óculos e as cores transbordam das formas,
As luzes tornam-se girândolas.
Volto a colocar os óculos sobre o nariz.
As cores são enquadradas pelas formas, aprisionadas.
Notas dispersas sobre Dorian Gray de Óscar Wilde
Há algum tempo atrás pensei que Dorian Gray representava a antítese de Narciso, porque embora em ambos se opere um processo de auto-conhecimento, ao contrário de Dorian Narciso renasceria na flor…Hoje já não sei
“Só os sentidos podem curar a alma, assim como só a alma pode curar os sentidos.” Óscar Wilde, Dorian Gray, (Lisboa, Portugália, s/d), p. 42
Dorian Gray ao encontrar o seu duplo no quadro, a imagem que se anima perante aquele mesmo que a vê, inicia uma experiência que lhe será fatal, culminando na destruição ou melhor dizendo na tentativa de destruição do quadro — momento da junção de Dorian e do duplo. Pp.369-370.
“A insinceridade é assim uma coisa tão terrível? Penso que não. É simplesmente um método pelo qual nós podemos multiplicar as nossas personalidades.
Era essa de certo modo a opinião de Dorian Gray. Admirava-se da superficialidade da psicologia daqueles que concebem o Eu no homem como uma coisa simples, permanente, duma só essência, e em que se pode confiar. Para ele, pelo contrário, o homem era um ser com miríades de vidas e miríades de sensações, uma criatura complexamente multiforme, que trazia dentro de si estranhos legados de pensamento e paixão, cuja própria carne estava infeccionada das monstruosas doenças dos mortos.”op.cit. pp.239-240.
O terror desencadeado pelo conhecimento de si alia-se por vezes a uma intensa fascinação. Dorian Gray após ter experimentado horror perante a modificação inicial operada no quadro (pp.155-159) — horror que nunca deixará de sentir, embora só por vezes tal sentimento aflore (pp.203 -207) — experimenta, depois, um estranho prazer na contemplação das mutações do seu retrato espiritual, (p.256) este comprazimento, também nunca o abandonará: “Haveria, assim, um autêntico prazer em espiar a modificação operada nas suas feições. Poderia seguir o seu pensamento até aos seus mais recônditos refolhos. Este retrato seria para ele o mais mágico dos espelhos. Assim como lhe revelaria o aspecto exterior do seu corpo assim lhe revelaria a intimidade da sua alma.”(p.182)
O romantismo alemão atribuiu ao duplo uma ressonância trágica e fatal, o duplo pode ser uma entidade complementar, mas na maior parte das vezes ele incita ao combate. Encontrar o duplo é nas tradições antigas um acontecimento nefasto, por vezes, mesmo, um sinal de morte. Ver Jean Chevalier; Alain Gheerbrant, Dictionnaire des Symboles, (Paris, Robert Laffont, 1982), pp.364-365.
Comentários
Creio que o mito de Narciso não seja a antítese de Dorian, já que ambas as figuras se eternizaram, se imortalizaram, Narciso através da flor com seu nome e Dorian através do seu retrato, que também "renasce" com sua morte, ou seja recupera seu estado original.
Grande abraço!