Henri Michaux

Fatias de Saber

Aos oito anos, eu ainda sonhava ser admitido como planta.

Dever-se-iam fazer os funerais nos pântanos. Não será justo que os vivos, que vão atrás do morto, se vejam também em apuros?

Suponha que os pensamentos são balões; o ansioso até nestes se pode cortar.

A vida em comum: perda de si, mas diminuição dos enigmas.

Pobreza sem dívidas, seria solidão demais, diz o pobre na sua sabedoria.


***

A arte é aquilo que ajuda a sair da inércia.
O que conta não é a repulsa ou o sentimento generador, é a vitalidade. É para aí chegar, consciente ou inconsciente, que a gente ruma a um certo estado com o máximo impulso, que é o máximo de densidade, o máximo de ser, o máximo de actualização de que o resto é apenas o combustível - ou o ensejo.

Por isso, contra a minha natural inércia, a que a arte me vem arrancar, é esse o mais enérgico meio interior de que disponho contra o meu próximo meio social, o que mais me realimenta, o que dá resposta a inúmeras situações, porque muito amiúde, na vida, me vejo ultrapassado, ou sem isso me veria ultrapassado.


Henri Michaux, O Retiro pelo Risco, (Lisboa, Fenda, 1999), pp.68-70 e 144.

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