Os Pássaros do Tempo

Mais um extracto da obra Os Sonhos de Einstein de Alan Lightman:

Na verdade, cada homem e cada mulher desejam apanhar um pássaro. É que este bando de rouxinóis é o tempo. O tempo que voa , que corre e salta com os pássaros. Aprisione-se um destes rouxinóis num frasco de vidro e o tempo deter-se-á. Esse momento ficará cristalizado para todas as pessoas, todas as árvores e todo o espaço nele contidos.
Acontece, porém, que estes pássaros raramente são apanhados. As crianças, as únicas que têm velocidade suficiente para os agarrarem, não têm vontade de fazer parar o tempo. Para as crianças, o tempo já anda demasiado devagar. Correm de um momento para outro, ansiosas pela chegada de cada aniversário, de cada Ano Novo, mal podendo esperar pelo resto das suas vidas. São os mais velhos que desesperadamente desejam fazer parar o tempo; mas esses são demasiado lentos, estão cansados de mais para apanharem qualquer pássaro. Para os mais velhos, o tempo escapa-lhes depressa de mais. Anseiam capturar um minuto que seja à mesa do pequeno almoço, enquanto bebem o seu chá, ou o momento em que uma das netas se vê atrapalhada para despir um fato de máscara, ou aquela tarde em que o sol de Inverno, reflectido na neve, inunda de luz a sala de música. Mas são lentos de mais. Sólhes resta ver o tempo saltar e voar para fora do seu alcance.
Naquelas ocasiões em que um rouxinol é capturado, os seus captores rejubilam com o momento assim eternizado. Saboreiam a disposição exacta da família e dos amigos, a expressão dos seus rostos, a felicidade aprisionada quando acontece um prémio, um nascimento ou uma história de amor, o perfume de canela ou de violetas brancas. Os captores rejubilam com cada momento assim cristalizado, mas em breve descobrem que o rouxinol expirou, que o seu canto cristalino de flauta se apagou, se fez silêncio, que o momento aprisionado murchou e definhou, privado de vida.


Lightman, "28 de Junho de 1905", in: op. cit. pp.104-106.

Do mesmo autor, editado em português, também pela Asa: Luz Antiga.Uma Introdução à Cosmologia, (Lisboa, Asa,1996.

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