O Décimo Segundo Aniversário
- O aniversário de XS, é já amanhã e ainda não sei o que oferecer-lhe!
- Isso lembra-me ... respondeu XY com um toque de melâncolia na voz.
- Lembra-te ... repetiu XX. - A julgar pela pose e pelo tom adoptados por XY, era de prever a eclosão de novo relato de um qualquer melodrama de infância.
- Como já te disse, descendo de um pai perturbado e perturbador, cujos distúrbios de personalidade se reflectiam no exercício de um autoritarismo arbitrário sobre os filhos, que incluía a proibição de relacionamento com vizinhos, os namoricos e os festejos de aniversário. No entanto, aquando do meu décimo segundo aniversário, decidi arriscar, pois o meu pai iria passsar o dia longe a tratar de negócios. Na vêspera convidei toda a turma e preparei o lanche. Após as aulas seguimos para minha casa, e fomos jogar para um jardim próximo, muito arborizado e com grutas artificiais. De volta, todos esfaimados de tanto correr, decidi servir o lanche. Estranhei, os víveres pareciam ter diminuído da noite para o dia. Ia para protestar junto da empregada, quando a vizinha Bernardette, a pedido de minha mãe, veio avisar que todos deviam retirar-se o mais depressa possível, porque o Monstrengo regressara antes do previsto e dado o seu temível mau génio não apreciaria encontrar a casa repleta de fedelhos.
Confirmei as declarações da vizinha e despedi-os com ansiedade e vergonha, antecipando os comentários maliciosos do dia seguinta na escola.
Quando me libertei do último colega ainda tive tempo de investigar na cozinha e esclarecer o mistério da diminuição da comida. Deparei-me com as prateleiras a abarrotar... A empregada escondera grande parte dos alimentos destinados ao lanche. Em seu entender, era demasiada comida para uns patetas de uns miúdos. Deu-me um acesso de ira. Além do mais, o meu pai acabou por atrasar-se e chegou tarde a casa...
- Agora percebo, porque o menu dos teus jantares de aniversário tem sempre um número escandaloso de pratos e julgas que a comida é insuficiente...
- Talvez, e deve ser por isso que sinto uma estranha angústia e fico de péssimo humor.
- Talvez,talvez, mas não achas que vai sendo tempo de superar esse episódio? Em primeiro lugar,o recalcamento está fora de moda. Por outro lado, há quem tenha vivido experiências bem mais traumatizantes. Por exemplo, XL cujo pai lhe prometeu que poderia fazer transferência de um qualquer colégio Salesiano para uma escola pública se obtivesse excelentes classificações, e quando posto perante o quadro de honra, onde figurava a cria, não cumpriu a sua palavra. De um só golpe defraudou as expectivas de XL, sujeitando-o ao confinamento físico e intelectual, sob o domínio de dogmas e moralismos ultrapassados.
- O que te faz afirmar com tanta segurança que a experiência de XL foi mais frustrante do que a minha? Não precisas de responder. Vou sair antes disso.
- O aniversário de XS, é já amanhã e ainda não sei o que oferecer-lhe!
- Isso lembra-me ... respondeu XY com um toque de melâncolia na voz.
- Lembra-te ... repetiu XX. - A julgar pela pose e pelo tom adoptados por XY, era de prever a eclosão de novo relato de um qualquer melodrama de infância.
- Como já te disse, descendo de um pai perturbado e perturbador, cujos distúrbios de personalidade se reflectiam no exercício de um autoritarismo arbitrário sobre os filhos, que incluía a proibição de relacionamento com vizinhos, os namoricos e os festejos de aniversário. No entanto, aquando do meu décimo segundo aniversário, decidi arriscar, pois o meu pai iria passsar o dia longe a tratar de negócios. Na vêspera convidei toda a turma e preparei o lanche. Após as aulas seguimos para minha casa, e fomos jogar para um jardim próximo, muito arborizado e com grutas artificiais. De volta, todos esfaimados de tanto correr, decidi servir o lanche. Estranhei, os víveres pareciam ter diminuído da noite para o dia. Ia para protestar junto da empregada, quando a vizinha Bernardette, a pedido de minha mãe, veio avisar que todos deviam retirar-se o mais depressa possível, porque o Monstrengo regressara antes do previsto e dado o seu temível mau génio não apreciaria encontrar a casa repleta de fedelhos.
Confirmei as declarações da vizinha e despedi-os com ansiedade e vergonha, antecipando os comentários maliciosos do dia seguinta na escola.
Quando me libertei do último colega ainda tive tempo de investigar na cozinha e esclarecer o mistério da diminuição da comida. Deparei-me com as prateleiras a abarrotar... A empregada escondera grande parte dos alimentos destinados ao lanche. Em seu entender, era demasiada comida para uns patetas de uns miúdos. Deu-me um acesso de ira. Além do mais, o meu pai acabou por atrasar-se e chegou tarde a casa...
- Agora percebo, porque o menu dos teus jantares de aniversário tem sempre um número escandaloso de pratos e julgas que a comida é insuficiente...
- Talvez, e deve ser por isso que sinto uma estranha angústia e fico de péssimo humor.
- Talvez,talvez, mas não achas que vai sendo tempo de superar esse episódio? Em primeiro lugar,o recalcamento está fora de moda. Por outro lado, há quem tenha vivido experiências bem mais traumatizantes. Por exemplo, XL cujo pai lhe prometeu que poderia fazer transferência de um qualquer colégio Salesiano para uma escola pública se obtivesse excelentes classificações, e quando posto perante o quadro de honra, onde figurava a cria, não cumpriu a sua palavra. De um só golpe defraudou as expectivas de XL, sujeitando-o ao confinamento físico e intelectual, sob o domínio de dogmas e moralismos ultrapassados.
- O que te faz afirmar com tanta segurança que a experiência de XL foi mais frustrante do que a minha? Não precisas de responder. Vou sair antes disso.
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