Objecto sexual

Aviso:

Qualquer semelhança entre esta historieta de mau gosto e um ou outro caso da vida real é pura coincidência.


Aqui estou, mais uma vez. Parece incontornável regressar, ciclicamente, a esta situação.
Aqui estou, a rever todas as visitas de Lavínia, todas as vezes que ela entrava em minha casa, se despia a uma velocidade estonteante enquanto ia dizendo que o seu filme preferido era o Império dos Sentidos e a trepidação dos transportes públicos lhe despertava o desejo. Na generalidade, encontrava-me nu, mas estava no meu território e como naturista a sério que me orgulho de ser, gosto de me libertar das amarras da civilização. Enquanto ela passa o tempo vestida, demasiado vestida até, talvez para ocultar a sua incomensurável lascívia.
Tirava a roupa com rapidez, cheirava-me como se eu fosse um bolo acabado de sair do forno e sem um beijo, ou uma carícia, instalava-se de joelhos ou de cócoras sobre mim. Exigia que já estivesse preparado, caso contrário olhava-me com desprezo recorrendo, de má vontade, às técnicas de indução de maior eficácia. Tal como Peter Drucker ela preconiza a distinção entre eficiência e eficácia e defende a operacionalização da última na economia do sexo.
Farto de ser tratado como um mero objecto de prazer, de me submeter aos caprichos da sua volúpia de um narcisismo primário, resolvi acabar com este caso constrangedor e nada digno do homem de princípios que julgo ser.
Ela aceitou com grande naturalidade a minha decisão, não mostrou qualquer sinal de tristeza ou de pena, nem tão pouco pediu qualquer tipo de justificação. Entramos num bar para festejar a civilidade da sua reacção. Pela primeira vez conversou comigo sobre outros assuntos que não fossem as cenas do Império dos Sentidos ou os efeitos das vibrações dos comboios na sua líbido.
Satisfeito comigo mesmo, bebi vários vodkas, Lavínia limitou-se a um. Só sei que comecei a desejar sugar o seu mamilo esquerdo - a Melanie Klein, explicaria bem melhor do que Freud, esta minha obsessão - e a sentir uma vontade intolerável de ser subjugado.
E aqui estou eu, a olhar o tecto desta pensão barata, a Lavínia endoidece-me o sexo com aquele sexo dela sempre a latejar de insatisfação. A Lavínia não emite um gemido, concentrada no que faz - está convencida que o máximo prazer só se atinge no máximo silêncio - enquanto eu grito como uma menina virgem e ela ameaça amordaçar-me.

Lúcio de Lacerda

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