Provocações

Viver com imensa e orgulhosa calma; sempre para além de. Ter e não ter, arbitrariamente, os seus afectos, o seu pró e contra, pousar neles, por umas horas; sentar-se neles como em cavalos, frequentemente como em burros: é o que se deve saber aproveitar a sua estupidez tal como a sua fogosidade. Conservar os seus trezentos primeiros planos; também os óculos escuros: pois há casos em que ninguèm nos deve olhar nos olhos e muito menos ainda nas nossas "razões". E escolher, para companhia, aquele vício matreiro e sereno: a delicadeza. E ficar senhor das suas quatro virtudes, a coragem, a perspicácia, a compaixão, a solidão. Pois a solidão é, entre nós, uma virtude, como tendência e ímpeto sublimes do asseio que adivinha como, no contacto de homem para homem - "em sociedade" - tudo é, inevitavelmente, sujo. Toda a comunidade - de qualquer modo, em qualquer parte, em qualquer altura - "torna vulgar".

Nietzsche, Para Além do Bem e do Mal, (Lisboa, Guimarães Editores, 1982), p.211.

Comentários

Mensagens populares