Christiana Morgan (2)

Christiana Morgan (Boston 1897 - Virgínia-Islands 1967)

Antes de apontar as razões que me fizeram ficar decepcionada com a obra de Claire Douglas, sobre Christiana Morgan, seguem-se alguns dados biográficos da co-autora do TAT.


Christiana Drummond Councilman Morgan, foi a segunda filha de três irmãs, de pai médico, professor na Harvard Medical School. Em criança, preferia o pai à mãe, uma vez que havia grandes afinidades de comportamento e interesses entre os dois.

De 1908-1914, frequentou a escola Miss Winsor para raparigas.
Em 1917 ficou noiva de William Morgan, com quem casou em 1919.

Corria o ano da Graça de 1920 quando deu à luz o seu único filho Thomas, pelo qual não nutriu particular afecto.
O casamento foi bastante tumultuoso. Para além das dificuldades e incompatibilidades entre ambos, Christiana teve vários amantes.

Entretanto, foram viver para Nova Iorque, onde Christiana fez cursos sobre Arte. Também foi nesta cidade que o casal conheceu Henry e Josephine Murray. Christiana e Henry sentiram-se muito atraídos um pelo outro, desenvolvendo uma amizade de grande cumplicidade intelectual e sentimental, ambos admiravam Jung e a obra de Herman Melville.

Entre 1926-27 viajou para a Suíça com o objectivo de ser analisada por Jung em Zürich.

Segundo as fontes, Morgan pintava as suas "visões" induzidas por transe, ou auto-hipnose. Jung fez um seminário a partir do material fornecido por Christiana.
Jung estaria convencido que Christiana ocultaria a sua espiritualidade feminina sob a sua racionalidade masculina. Foi na década de 30, que Jung realizou o seminário sobre os desenhos e textos de Morgan, os quais utilizou como provas para fundamentar a sua teoris dos arquétipos do inconsciente colectivo. Aliás, Jung serviu-se de modo semelhante das descrições de sonhos e visões do físico Wolfgang Pauli.
Também, teria sido Jung que a aconselhou a iniciar uum relacionamento amoroso com Murray - tal como influenciara Murray, a fazer o mesmo - a fim de observar o inconsciente. Nesse sentido, sugeriu-lhe que se tornasse a musa - femme inspiratrice, a imagem da anima de Murray.
Ao invés de criar filhos ela , criaria um homem, servi-lo-ia, e por seu intermédio serviria a Humanidade. Segundo Claire Douglas, Jung projectou neles a sua própria ligação com Toni Wolf, a qual analisou o marido de Christiana, e lhe recomendou que aceitasse o relacionamento entre a mullher e Henry, procedendo de forma idêntica à adoptada por Jung. Na verdade, Christiana e Henry tornaram-se colaboradores e amantes, durante cerca de 40 anos, até à morte dela. Embora, tanto um como o outro, mantivessem ligações paralelas e não se tenham divorciado dos respectivos cônjuges.
Em 1934, o marido morreu.
1938, co-criou o Thematic Apperception Test (TAT), o qual foi, primeiramente, designado por Morgan-Murray Thematic Apperception Test. Mais tarde, passou por novo baptismo e passou a ser o Murray e "staff of the Harvard Psychological clinic Thematic Apperception Test.
Entretanto, Christiana sofreu graves problemas de saúde. Devido à sua elevada pressão arterial foi submetida a uma intervenção cirúrgica de alto risco - uma simpaticectomia.
No intuito de manter viva a ligação entre ambos, Morgan e Murray desenvolveram um relacionamento de tipo sado-masoquista.
Morgan tinha graves crises de alcoolismo, cuja causa seria a sua frustração sentimental e profissional, as suas depressões e estado de saúde. Os efeitos da embriaguez provocavam o desagrado de Henry Murray.
Em 1965, Murray, já viúvo,interessou-se,e iniciou um relacionamento, uma vez mais, e com maior profundidade com uma mulher bastante mais jovem, com quem viria a casar, após a morte de Morgan.
1967, Morgan e Murray viajaram até às Virgin Islands, numa tentativa de viver momentos de reconciliação, que se revelou desastrosa, porque Christiana ao perceber que o amante não se sentia atraído por ela, voltou a beber e acabaria por suicidar-se por afogamento, aos 69 anos de idade.

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De acordo com Claire Douglas, Christiana dourou o seu papel de amante ao criar uma mitologia privada com ídolos e deuses criados e esculpidos por ela. Segundo Douglas "was one more triangle that primarily served the interests of a man," contribuindo para o seu alcoolismo e suicídio. Douglas retrata-a como uma mulher independente que se rebelou contra a sua mãe, uma "Boston Brahmin mother", teve amizades apaixonadas com Lewis Mumford e Alfred North Whitehead, mas que se teria traído a si mesma ao sacrificar a sua própria criatividade em função de Henry Murray.
Penso que há questões cruciais a colocar, face à perspectiva de Christiana vítima de Jung e Murray, defendida por Douglas na biografia de Morgan: sendo Christiana uma mulher dotada de uma personalidade independente e forte, que sempre ousou actuar de modo diferente, nomeadamente no que concerne aos papéis convencionais de esposa e de mãe, porque se teria submetido, sem crítica, aos conselhos de Jung? Porque não abandonou Murray, e não escreveu de forma autónoma? Ela não precisava da permissão de Jung para escrever e criar, até porque o psicólogo se encontrava a muitas milhas de distância. Apesar de Jung e Murray terem contribuído para a sua "anulação", parece-me que Morgan optou por este caminho, porque era essa a sua vontade, porque cedeu à tentação de Pigmalião, bem assim como à presunção de julgar que a sua história de amor com Murray seria especial, e que o seu investimento nela, bem assim como a sua análise - projecto que Morgan não chegou a concretizar - traria importantes revelações sobre o relacionamento amoroso e sexual em geral.

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