A Origem da Arte Segundo Melanie Klein
As teses de Klein sobre a interiorização precoce da primeira relação da criança com a mãe inauguraram uma nova abordagem na crítica de arte, em função das profundas alterações nas perspectivas psicanalíticas sobre a criatividade e a arte, cuja origem Freud atribuia à sublimação da pulsão individual, enquanto Klein concebe a arte como o reflexo de um desejo de reparar as relações com os outros, e em primeiro lugar com a mãe. Na conferência intitulada " Infantile anxiety-situations reflected in art, creative impulse", dada na Sociedade de Psicanálise Britânica, em Maio de 1929, para ilustrar a sua tese recorreu à análise da ópera de Ravel, L'Enfant et les Sortilèges e à obra da pintora Ruth Kjär.
A ópera de Ravel inicia-se com a cena de um rapaz exasperado por ter que cumprir os seus deveres. Preferia ir passear para o parque, puxar a cauda ao gato e agarrar-se a toda a gente, em particular à sua mãe. Quando entra a mãe pergunta-lhe se já terminou as suas tarefas, e ele responde-lhe mostrando-lhe a língua, provocador. A mãe logo aplica a punição: "Comerás pão seco e chá sem açúcar". Confrontado com esta frustração da sua oralidade, como diz Klein, o pequeno expande a sua cólera. Agride os animais domésticos, atira objectos ...Como a criança edipiana procura agredir o corpo da mãe e o pénis do pai que aí se encontra. Entretanto, os objectos que ele agride animam-se. Segue-se um grande alarido. O rapaz refugia-se no parque, que está repleto de coisas aterradoras, de animais que lhe batem e mordem. Segundo Klein, estes seres personificariam a imagem da mãe que o ataca tal como ele queria atacá-la. Um esquilo cai no solo perto dele. O rapaz recolhe-o e cuida da sua pata ferida. Subitamente, o seu mundo torna-se mais amigável, os animais que antes o aterrorizavam, depois do seu gesto gentil, olham-no com melhores olhos e ele pode, por fim, reencontrar a mãe.
Fundamentando-se na narração da vida e da obra da artista Ruth Kjär, Melanie fornece a seguir uma ilustração de um desenvolvimento similar na rapariga, da agressão à ternura reparadora. Bela, independente e rica Ruth passava por períodos de depressão, no decurso dos quais experimentava um vazio interior insuportável, análogo ao vazio deixado na sua parede por um quadro que o seu cunhado levara. Isto desolava-a mais do que tudo, até ao dia em que decidiu preencher esse espaço por um quadro da sua autoria.
"This [the selling of a familiar picture] left an empty space on the wall, which in some inexplicable way seemed to coincide with the empty space within her."
Melanie Klein interpreta este espaço vazio como: "a feeling that there was something lacking in her body." Este vazio no corpo derivaria da ansiedade da rapariga da retribuição devido às suas fantasias sádicas sobre a destruição do corpo da mãe: "the little girl herself of the contents of the body (especially of children)" and of her own body being "destroyed or mutilated. [...] When the little girl who fears the mother's assault upon her body cannot see her mother, this intensifies the anxiety. The presence of the real, loving mother diminishes the dread of the terrifying mother, whose introjected image is in the child's mind."
Melanie Klein, Infantile Anxiety-Situations Reflected in A work of Art and in the Creative Impulse, in, Contributions to Psycho-Analysis 1921-1945, Hogarth Press 1948, p. 234
A ópera de Ravel inicia-se com a cena de um rapaz exasperado por ter que cumprir os seus deveres. Preferia ir passear para o parque, puxar a cauda ao gato e agarrar-se a toda a gente, em particular à sua mãe. Quando entra a mãe pergunta-lhe se já terminou as suas tarefas, e ele responde-lhe mostrando-lhe a língua, provocador. A mãe logo aplica a punição: "Comerás pão seco e chá sem açúcar". Confrontado com esta frustração da sua oralidade, como diz Klein, o pequeno expande a sua cólera. Agride os animais domésticos, atira objectos ...Como a criança edipiana procura agredir o corpo da mãe e o pénis do pai que aí se encontra. Entretanto, os objectos que ele agride animam-se. Segue-se um grande alarido. O rapaz refugia-se no parque, que está repleto de coisas aterradoras, de animais que lhe batem e mordem. Segundo Klein, estes seres personificariam a imagem da mãe que o ataca tal como ele queria atacá-la. Um esquilo cai no solo perto dele. O rapaz recolhe-o e cuida da sua pata ferida. Subitamente, o seu mundo torna-se mais amigável, os animais que antes o aterrorizavam, depois do seu gesto gentil, olham-no com melhores olhos e ele pode, por fim, reencontrar a mãe.
Fundamentando-se na narração da vida e da obra da artista Ruth Kjär, Melanie fornece a seguir uma ilustração de um desenvolvimento similar na rapariga, da agressão à ternura reparadora. Bela, independente e rica Ruth passava por períodos de depressão, no decurso dos quais experimentava um vazio interior insuportável, análogo ao vazio deixado na sua parede por um quadro que o seu cunhado levara. Isto desolava-a mais do que tudo, até ao dia em que decidiu preencher esse espaço por um quadro da sua autoria.
"This [the selling of a familiar picture] left an empty space on the wall, which in some inexplicable way seemed to coincide with the empty space within her."
Melanie Klein interpreta este espaço vazio como: "a feeling that there was something lacking in her body." Este vazio no corpo derivaria da ansiedade da rapariga da retribuição devido às suas fantasias sádicas sobre a destruição do corpo da mãe: "the little girl herself of the contents of the body (especially of children)" and of her own body being "destroyed or mutilated. [...] When the little girl who fears the mother's assault upon her body cannot see her mother, this intensifies the anxiety. The presence of the real, loving mother diminishes the dread of the terrifying mother, whose introjected image is in the child's mind."
Melanie Klein, Infantile Anxiety-Situations Reflected in A work of Art and in the Creative Impulse, in, Contributions to Psycho-Analysis 1921-1945, Hogarth Press 1948, p. 234
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