Da Voluptuosidade (4)
Sensualismo Naturalista
Seguem-se quatro excertos da obra O Barão de Lavos, 1º volume da triologia do ciclo Patologia Social do escritor naturalista Abel Botelho. Trata-se de um dos mais conhecidos textos da ficcção portuguesa dos finais do século XIX e um dos mais característicos do “naturalismo português”, se é que se pode falar de um movimento literário naturalista português.Romance agora esquecido. Aquando da sua publicação foi objecto de escândalo e polémica, facto que o tornou uma dessas obras obrigatoriamente citadas por críticos e historiadores, mas desconhecidas do público.Por tudo isto e muito mais aconselho a sua leitura.
Por fim a baronesa cedeu, vencida do simpatismo sensual, prostada de fadiga. O efebo alcançara-a novamente e adstrigia-a contra o peito num abraço fervido, inclemente. Dava-lhe aos músculos uma têmpera de aço a rigidez impetuosa do desejo.
– Inevitável!- Elvira abandonou-se…Os olhos molharam-se-lhe, o rosto fez-se mais pálido, os pés tartamelearam um instante na alcatifa, desfalecidos. Doíam-lhe os bicos dos peitos, tinha frio nas fontes, o coração parava-lhe… Cingida sempre por Eugénio, lânguidamente recumbiu sobre a causeuse… e suplicava ainda:
— Não! Não! Eugénio…isso não!(…)
Desde esse dia uma fase nova se abriu, de comoções e turbulências, na vida regrada e simples da baronesa. Como um golpe de luz, numa tela de Velásquez, chispa de repente a dar valor às caóticas confusões do claro escuro, assim a ousadia de Eugénio veio aquecer e tornar férteis, vibrantes as modalidades daquela alma baça de burguesita, cujos valores sensoriais e afectivos, mercê das condições de educação e convivência, se tinham até ali conservado nulos, espatinados, surdos. O efebo foi da ânsia latente de gozar dessa branca mocidade, o Galvani afortunado. A sua amorosa investida foi o revelador de quanta sede de prazer bravejava ignorada na carne e no espírito da mulher do barão.(…)
Mal que o efebo, a horas próprias apontava junto da baronesa, ela atirava-se-lhe, tremendo, contra o peito apolíneo, numa ânsia vitoriosa e exultante, e colava os lábios aos lábios, sorvia-o, cingia-o, estrangulava-o, a desforrar-se na cachoante exaltação de um magnífico instante de loucura, dessa chateza dissaborida e mesquinha do seu viver interior. Gozavam… E depois dormente no abandono lânguido, feliz, na complacente lassidão em que os paroxismos do prazer nos amolentam, a baronesa demorava as mãos entre as mãos do efebo, sentava-se-lhe no colo, afagava-o e olhava-o longamente, numa expressão empanada e húmida, misto de gratidão e de ternura.(…)
Eugénio foi gradualmente, de sua banda, aquecendo e renitindo na frequentação amorosa da baronesa. Às audácias e apetites próprios da sua fresca juventude , ajuntava-se a acicatar-lhe o desjo o irritante prazer destes amores clandestinos, o receio, a precipitação, a incerteza, o acirrativo travor da dificuldade. Sempre que podiam, os dois amavam-se sem reservas, dias e dias de seguida, afastando o barão, distraindo os criados, de dia ou de noite, no primeiro minuto que pudessem subtrair ao chorrilho habitual da vida – com uma frequência, um furor, uma plenitude e uma audácia que passavam as raias da demência.
Abel Botelho, O Barão de Lavos, (Lisboa, Livros do Brasil, s/d), pp. 222-225.
Sensualismo Naturalista
Seguem-se quatro excertos da obra O Barão de Lavos, 1º volume da triologia do ciclo Patologia Social do escritor naturalista Abel Botelho. Trata-se de um dos mais conhecidos textos da ficcção portuguesa dos finais do século XIX e um dos mais característicos do “naturalismo português”, se é que se pode falar de um movimento literário naturalista português.Romance agora esquecido. Aquando da sua publicação foi objecto de escândalo e polémica, facto que o tornou uma dessas obras obrigatoriamente citadas por críticos e historiadores, mas desconhecidas do público.Por tudo isto e muito mais aconselho a sua leitura.
Por fim a baronesa cedeu, vencida do simpatismo sensual, prostada de fadiga. O efebo alcançara-a novamente e adstrigia-a contra o peito num abraço fervido, inclemente. Dava-lhe aos músculos uma têmpera de aço a rigidez impetuosa do desejo.
– Inevitável!- Elvira abandonou-se…Os olhos molharam-se-lhe, o rosto fez-se mais pálido, os pés tartamelearam um instante na alcatifa, desfalecidos. Doíam-lhe os bicos dos peitos, tinha frio nas fontes, o coração parava-lhe… Cingida sempre por Eugénio, lânguidamente recumbiu sobre a causeuse… e suplicava ainda:
— Não! Não! Eugénio…isso não!(…)
Desde esse dia uma fase nova se abriu, de comoções e turbulências, na vida regrada e simples da baronesa. Como um golpe de luz, numa tela de Velásquez, chispa de repente a dar valor às caóticas confusões do claro escuro, assim a ousadia de Eugénio veio aquecer e tornar férteis, vibrantes as modalidades daquela alma baça de burguesita, cujos valores sensoriais e afectivos, mercê das condições de educação e convivência, se tinham até ali conservado nulos, espatinados, surdos. O efebo foi da ânsia latente de gozar dessa branca mocidade, o Galvani afortunado. A sua amorosa investida foi o revelador de quanta sede de prazer bravejava ignorada na carne e no espírito da mulher do barão.(…)
Mal que o efebo, a horas próprias apontava junto da baronesa, ela atirava-se-lhe, tremendo, contra o peito apolíneo, numa ânsia vitoriosa e exultante, e colava os lábios aos lábios, sorvia-o, cingia-o, estrangulava-o, a desforrar-se na cachoante exaltação de um magnífico instante de loucura, dessa chateza dissaborida e mesquinha do seu viver interior. Gozavam… E depois dormente no abandono lânguido, feliz, na complacente lassidão em que os paroxismos do prazer nos amolentam, a baronesa demorava as mãos entre as mãos do efebo, sentava-se-lhe no colo, afagava-o e olhava-o longamente, numa expressão empanada e húmida, misto de gratidão e de ternura.(…)
Eugénio foi gradualmente, de sua banda, aquecendo e renitindo na frequentação amorosa da baronesa. Às audácias e apetites próprios da sua fresca juventude , ajuntava-se a acicatar-lhe o desjo o irritante prazer destes amores clandestinos, o receio, a precipitação, a incerteza, o acirrativo travor da dificuldade. Sempre que podiam, os dois amavam-se sem reservas, dias e dias de seguida, afastando o barão, distraindo os criados, de dia ou de noite, no primeiro minuto que pudessem subtrair ao chorrilho habitual da vida – com uma frequência, um furor, uma plenitude e uma audácia que passavam as raias da demência.
Abel Botelho, O Barão de Lavos, (Lisboa, Livros do Brasil, s/d), pp. 222-225.
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